quarta-feira, abril 12, 2006,1:39 PM
É Sempre Bom Continuar Mantendo o Respeito...



Há 20 anos, quando o Master Of Puppets foi lançado, pegou todos os headbangers e a indústria especializada de assalto. Acostumados com discos de produção mediana ou com canções que invocavam dragões e elfos para batalhas fantasiosas, o Metallica era tido como um bicho estranho. Com uma postura violenta aliada a uma consciência social, seus dois primeiros discos foram acolhidos muito bem pela crítica especializada, mas ainda não tinham saído do gueto underground para os ouvidos do mundo inteiro.

Porém, foi apenas com Master Of Puppets que a coisa começou a ficar realmente séria, nenhuma banda da cena thrash metal tinha conseguido compor um pertado de som tão nítido e extremamente pesado, erguido com muralhas de guitarras que tiraram o sono de muitos guitarheroes no mundo inteiro.

Mas a brutalidade não estava sendo gratuita, dava pra notar um certo amadurecimento técnico nos arranjos e nas letras das músicas que narravam o pesadelo de jovens sendo mandados a uma guerra que não dizia respeito a eles, mas aos suspeitos interesses de seu país. E logo se tornou um clássico instantâneo, a reformulação que o metal estava pedindo desde que o Black Sabbath bateu as botas.

Para os fãs mais tradicionais este disco tem uma áurea única, por ter sido o último registro de estúdio do baixista Cliff Burton, um dos ícones mais míticos da história do metal, sendo considerado, por muitos, o deus do contra baixo, que morreu após um acidente com o tourbus e para muitos o final da era pura do Metallica.

Uma Homenagem "Duvidosa" ?



Juntando a este histórico, nada seria mais oportuno para a Kerrang!, lançar um disco tributo celebrando o aniversário de 20 anos do Master Of Puppets, apresentando esta obra-prima a um público novato que desconhece as raízes de seus artistas mais queridos. Resgatando um pouco do respeito que o Metallica perdeu e mostrando que alguns de seus maiores clássicos, continuam mais atuais do que nunca.

Mas qualquer boa intenção pode ser desmistificada, principalmente, se for considerar a primeira impressão que vem a mente, pois dificilmente um tributo consegue fugir do estigma de caça-níqueis barato. Ainda mais em relação a uma banda com o número de escândalos que o Metallica tem feito nos últimos anos, que chorava cada centavo perdido nos serviços de download gratuito e oficializando tributos bem dispensáveis, como uma releitura hip hop do Black Album. É natural ficar com os dois pés atrás, ainda mais sobre um tributo organizado por uma revista tão picareta quanto a Kerrang!.

Todas as suspeitas poderiam ser bem justificáveis, se não fosse por um detalhe bem honesto que só pode ser constatado depois da primeira audição, eles conseguiram manter o respeito com a obra-prima do metal oitentista. As releituras pouco fogem dos arranjos originais, e claro, ganham um certo peso devido às novas tecnologias de engenharia de estúdio, mas sem destruir aquela pegada que só o Metallica tem.

A banda que mais chega perto disso é o veterano Machine Head com uma versão pesadíssima da já pesada, Battery. Os outros artistas também não fazem feio, e conseguem reproduzir todos os detalhes do disco numa certa precisão, com uma ou outra liberdade artística proveniente da identidade de cada banda.

Como é o caso do Mastodon, que fez uma boa releitura da instrumental Orion, outros podem até surpreender como o Funeral for a Friend que foge totalmente do emocore para mostrar o seu rabo pontudo do metal em Garage Inc ou ao Chimaira que tocou direitinho a fenomenal Disposable Heroes. O único senão fica para o Bullet for my Valentine que deixou Sanitarium meio melosa, mas é só escutar a versão do Mendeed para The Thing That Should Not Be e os detalhes negativos ficam em segundo plano.

No final das contas, temos uma homenagem bem equilibrada e mais digna do que a promovida pelo Mtv Icon, por exemplo, que tinha artistas descartáveis fazendo versões realmente muito ruins para os clássicos de uma banda que já foi um motivo de orgulho para os seus fãs.

V.A. - Kerrang Presents Remastered - Metallicas Master Of Puppets Revisited (2006)
Nota: 8,0
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Escrito por Tiago Trindade
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quarta-feira, abril 05, 2006,12:20 PM
O verdadeiro filho de Frankstein



Depois que o punk fez o favor de resgatar todo o sentido de fazer rock'n'roll, como algo simples e despojado, o rock progressivo foi taxado de praga. Foi base para muitos artistas chatos dentro do mundo pop, que continuaram botando em prática as ambições clássicas do Yes. Mas tudo que poderia ser ruim acaba deixando sempre uma herança que pode ser aproveitada de uma forma benéfica.

Após 20 anos do rock progressivo ter dado seu último suspiro, grupos obscuros resolveram casar o princípio emocional e minimalista do punk rock com a viagem alucinógena que Sid Barret fez fama no Pink Floyd, juntando as sonoridades mais contemporâneas, criando um clima claustofóbico e muito peculiar. Dentro desse quitute da nega doida, o Mogwai foi sempre um grupo de referência para todos que quiseram se perigar no terreno do post rock, alcunha que foi dada pelo critico inglês Simon Reynolds no meio dos anos 90, a grupos que desconstruiam o rock alternativo.

Trancados num quarto escutando Slint, My Bloody Valentine, Joy Division e claro Pink Floyd, o Mogwai passou boa parte da década de 90 num mundo paralelo. E ao sair da bolha, foi um dos grupos que antecedeu a atitude esquizofrenica que bandas como Radiohead adotariam como repúdio ao som comercial e redondo no final de século.

Conhecidos pelas suas músicas instrumentais que se arrastam por mais de 10 minutos, com direito a doses massivas e gratuitas de distorções que faria o mais bravo headbanger corar de vergonha, o Mogwai é protagonista de shows que vão do psicodelismo seco e delicado, a uma avalanche sonora violentíssima. Quem já foi aos shows deles sabe do que estou falando, é muito comum você ouvir depoimentos de pessoas que passaram quase mais de uma semana sem conseguir escutar direito.

Mesmo embebidas por oceanos de distorções, todas as suas composições possuem um desenvolvimento hiptonizante que leva o ouvinte a uma experiência quase espiritual, que logo depois cessa sem maiores alardes, como se nada tivesse acontecido. E quando você pensa que ficaria por isso mesmo, lá vem outra avalanche de efeitos e distorções que dão uma cartaze quase narcótica ao ouvinte que, felizmente, agora se tornou uma presa inofensiva. E para agrado dos fãs mais radicais, eles mudaram em poucas coisas desde o primeiro álbum, mas não quer dizer que são acomodados. Em discos como Rock Action e Come Die Young, eles deixam as distorções puras e simples um pouco de lado, para uma direção musical quase cinematográfica.

Recentemente, lançaram um ótimo disco chamado, Mr. Beast, onde conseguiram aliar a brutalidade do começo de carreira, com o experimentalismo dos últimos discos. Vocais com pedais de efeito criam uma simbiose perfeita com uma parede de guitarras tão consistente que deixaria Phil Spector muito orgulhoso. Fazendo justamente músicas de noção estranha, como se um grupo de rock fizesse uma trilha para um filme de Stanley Kubrick. Mesmo depois de muitos anos, o Mogwai continua preso em uma bolha atemporal, que os fazem ser imunes a qualquer tipo de moda ou hype exagerado da imprensa especializada.

O Novo Desbunde...

Enquanto muitos perdem salivas falando de um possível revival dos anos 90 ou de uma evolução da ponte rock'n'roll pista de dança, uma das maiores ironias da historia do rock está prestes a acontecer. Depois que Artic Monkeys e cia serem lembrados como grupos de rock enlatado, uma das válvulas de escape mais previsíveis será a ressurreição do rock progressivo. Não pela forma clássica que fez fama de grupos como King Crimson, mas uma nova variação sem rótulo ainda. Muitos novos grupos, influenciados ou não pela loucura do Mogwai, Sigur Ros e Tortoise, estão resgatando o princípio de fazer rock com um acabamento artístico mais sólido. O negocio é tão sério que classificá-los como post-rock, como a maioria dos críticos costuma enquadrar, é um grande equívoco.

Desse meio os nomes mais expressivos são:



Mars Volta, que literalmente resgata o experimentalismo progressivo da década de 70 com músicas de meia hora, mas sem jamais perder o punch. O seu experimentalismo desenfreado chega a lembrar um pouco o saudoso Mr.Bungle. Free jazz, hard rock, música latina, punk rock de raiz e, principalmente, rock progressivo fazem parte dessa salada bizarra. Eles chegaram a se apresentar no Tim Festival 2004, fizeram uma apresentação bombástica, sendo que no final do show a platéia abriu o coro: "Fuck Libertines!" que fez um show vergonhoso.



Os dinamarqueses do Mew em seu último disco, "And The Glass Handed Kites...", compôs um álbum conceitual, quase uma ópera rock emulando as distorções e a delicadeza de um My Bloody Valentine com a viagem lisérgica do Gênesis da fase Peter Gabriel. A coisa é tão descarada que a arte do disco é uma espécie de homenagem ao clássico lisérgico Forever Changes do Love. Eles foram apontados como queridinhos de muitos críticos por causa do seu debut internacional, Frengers. Mas agora deixaram o lado pop um pouco de lado para apostarem em outros experimentos sonoros.



Outro exemplo desta nova estética são os canadenses do Black Mountain, que com seu stoner rock movido a LSD lembra em muitos momentos grupos como o Pink Floyd no início de carreira e grupos psicodélicos como Jefferson Airplane. Seu debut auto-intitulado Black Montain está na lista das grandes revelações de 2006 e não vai demorar muito para o grupo meter os dois pés na jaca e se juntar de vez a badtrip.



Os americanos do Tool não fazem parte desta nova geração e são velhos conhecidos dos apreciadores de rock pesado, mas como poucos sabem dosar suas influências de Black Sabbath, Nine Inch Nails e King Crimson, citei eles aqui porque estão preste a lançar o sucessor de "Lateralus", um dos discos mais legais e inclassificáveis que o metal moderno já produziu e foi batizado de "10,000 Days". Se essa moda neoprogressiva/psicodélica realmente pegar o Tool será inevitavelmente lembrado.

Para quem tem uma noção razoável, não irá se espantar, pois este é um processo que está tomando corpo de uma forma lenta mas substancial, que começou ainda nos anos 90 com grupos como Radiohead e Sigur Ros, estes que estão cada vez mais estranhos e experimentais, e muitos outros grupos novos estão aderindo a esta fórmula. Portanto, mesmo que não se torne algo muito popular, esta nova estética será uma constante nos próximos anos.

 
Escrito por Tiago Trindade
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